Publicamos como primeiro post, e fagulha inicial desse blog, a carta do empresário Jairo Fonseca ao TecSoft.
TecSoft – Centro de Tecnologia de Brasília
A/C Sr. Djalma Petit,
Assunto: TI Menor, o apagão tecnológico, a esquizofrenia estatal em relação a inovação em software, a ineficiência do fomento e a resultante nula do movimento browniano, ou a pior das síndromes de Macunaíma.
Exmo. Senhores,
Trata a presente correspondência de alertar V. Excelência da completa ineficácia e ineficiência de políticas públicas para o desenvolvimento de tecnologia genuinamente nacional voltada à área de Tecnologia da Informação (TI). Tais políticas são incapazes de promover o desenvolvimento soberano no País nesta área vital, conforme será aqui detalhado. Reconhecemos interesse e empenho de Vossa Excelência em desenvolver este setor no Brasil, tendo ocupado cargos relevantes relacionados ao tema acreditamos ser Vossa Excelência o interlocutor e o agente certo para patrocinar uma completa revisão das políticas públicas voltadas ao nosso setor.
Como é do seu conhecimento, o setor de Tecnologia da Informação é estratégico para o desenvolvimento social, econômico e tecnológico de um país. No competitivo contexto global, dominar as tecnologias envolvidas com este setor é fator crítico de sucesso para uma nação com implicações inclusive no que tange à sua soberania, como comprovou o episódio de monitoramento das comunicações da então Presidente da República, entre outros atores de destaque do cenário nacional, como executivos, políticos e magistrados. Em face a tal importância estratégica, considerando os investimentos públicos realizados e previstos, bem como os resultados alcançados com tais fomento, é importante promover uma profunda análise crítica das políticas, dos seus instrumentos e da operacionalização do apoio setorial como foco na Tecnologia da Informação no Brasil, conforme será detalhado mais adiante nesta correspondência e em seus anexos.
Na qualidade de empresário de software há 30 anos. Porém, em que pese ser sócio e diretor de duas empresas de TI, a Light Infocon Tecnologia e a LightBase Tecnologia Serviços e Consultoria em Software Público, sou o que se denomina no jargão de mercado, de ‘escovador de bits’, o profissional que mergulha nos aspectos da tecnologia, escrevendo códigos e criando softwares. Meu interesse pessoal, portanto, é a parte tecnológica. Não tenho envolvimento político-partidário nenhum, sendo meu interesse somente o crescimento de nosso Brasil em uma área que tenho pleno convencimento de que podemos ser um ator de relevância no cenário mundial.
Minha primeira empresa, a Light Infocon, desenvolveu uma tecnologia genuinamente nacional e completamente inovadora, um banco de dados textual, multimídia e multidimensional, que vem sendo o nosso carro-chefe comercial. Várias instituições públicas e privadas usam ou já usaram nossos softwares. Mais de 10.000 cópias do Light Base, em suas diversas versões – DOS, Windows, Linux, WEB e mais recentemente “Cloud”, estão em uso no mercado, tanto no Brasil como no exterior. Pasme o senhor: nossos concorrentes são a IBM, a Oracle e a Microsoft, que oferecem ao mercado suas versões de banco de dados relacionais, uma tecnologia distinta da nossa. E estamos no mercado há 30 anos! Já fomos premiados em diversas publicações no Brasil e no exterior. Tivemos apoio da FINEP e do BNDES em algumas etapas de nossa vida empresarial. Portanto, sinto-me a vontade para falar, pois o faço com conhecimento de causa de uma pessoa que dedicou a vida profissional ao desenvolvimento de tecnologia para TI.
Convém neste ponto esclarecer um aspecto fundamental: a diferença entre desenvolver tecnologia e desenvolver aplicações. No caso do desenvolvimento de tecnologia, o profissional ou a empresa, desenvolve códigos inteiramente novos, que agrupados e seguindo uma sequência lógica planejada, transformam-se em novos produtos de software. Citam-se, como exemplo de desenvolvimento de tecnologia, o desenvolvimento de códigos para a criação de gerenciadores de e-mails, browsers para Internet, programas de segurança da informação, firewalls, gerenciadores de banco de dados, compiladores, geradores de aplicações, geradores de formulários, linguagens de desenvolvimento, servidores web, processadores de textos, planilhas eletrônicas, programas de CAD, etc.
Desenvolver tecnologia é o que garante a independência tecnológica de uma nação. Os frutos também são altamente compensadores, do ponto de vista econômico (pela replicabilidade e utilização por terceiros), na geração de empregos de alto nível e na formação de recursos humanos qualificados, entre outros aspectos facilmente identificados.
Já o desenvolvimento de aplicações concentra-se no desenvolvimento de novas soluções calcadas em tecnologias já desenvolvidas. Exemplo: uma aplicação de tramitação baseada ou uma aplicação de controle do “Bolsa-família”. Não há criação de uma nova tecnologia e sim a utilização de uma tecnologia já desenvolvida. A nova solução é desenvolvida, portanto, a partir de uma tecnologia já dominada, agregando-se o conhecimento de determinado domínio ou de determinado processo de negócio (por exemplo, as etapas de gestão do Bolsa-familia). Desta forma, apenas para citar um aspecto decorrente, há pagamento de royalties ou benefícios de participação de mercado para o detentor da propriedade intelectual da tecnologia (quem efetivamente a criou) para cada aplicação gerada nela baseada.
Assim, abordando o tema principal desta correspondência, vimos aqui afirmar, de forma veemente, que praticamente todo o esforço oficial e para-oficial, atualmente no Brasil, para o desenvolvimento setorial concentra-se no apoio ao desenvolvimento de aplicações e não no desenvolvimento de tecnologia. Portanto não há no Brasil, políticas de apoio ao desenvolvimento de tecnologia em TI, e se existem são completamente mal utilizadas.
Pior: a principal política pública de desenvolvimento setorial, que seria o uso do poder de compra do estado para adquirir tecnologia genuinamente nacional é inexistente, sendo praticamente vedado ao criador de tecnologia nacional vender ao poder público, conforme será detalhado no anexo. Os efeitos desta postura são facilmente identificáveis: dependência tecnológica e econômica, inexistência de “externalidades” positivas para outros setores econômicos e tecnológicos, evasão excessiva de divisas (pelo pagamento de royalties), balança de pagamentos setorial deficitária e perda de soberania.
Reivindicar políticas públicas de apoio ao desenvolvimento de tecnologia em TI não é um ‘sonho de uma noite de verão’. Temos sim condições de experimentar um novo processo de desenvolvimento tecnológico acentuado, se tomarmos as decisões certas. Não se é contra o apoio ao desenvolvimento de aplicações, pois tal segmento também tem sua importância. Porém, temos que mudar radicalmente o foco principal das políticas públicas, sob pena de perpetuarmos e acentuarmos o fosso e a nossa escravidão tecnológica.
É importante recordar que a indústria de software e serviços de Tecnologia da Informação do Brasil já foi uma das mais pujantes do mundo, em se tratando de desenvolvimento de tecnologia. O ápice da indústria ocorreu em 1998. Centenas de desenvolvedores brasileiros de software calcavam sua estratégia comercial na criação de tecnologia nacional.
No entanto, tudo se perdeu. E as políticas públicas, como este Plano TI Maior, vêm a cada ano, a cada plano, pela falta de eficácia, assegurando nosso lugar fora do mainstream da Tecnologia da Informação mundial. Nossos formuladores de políticas públicas, pela ignorância sobre o setor e sobre o mercado, sobre a pretensa onisciência, prepotência e empáfia, por recusa em ouvir a indústria procuram emular (ou simplesmente copiar) o que deu certo em outros países. Tentamos copiar a Índia, não deu certo. Agora estamos tentando copiar Israel, pelo apoio incondicional às start-ups. Não está dando! Os responsáveis por esta política pública não procuram avaliar se a start-up gera tecnologia ou não; em Israel sempre geram!
O Plano TI Maior é um engodo! Porque seus formuladores não procuram entender o setor conversando com pessoas que conhecem a fundo a matéria? Porque se arvoram dentro de seus gabinetes, de propor políticas, sem ouvir os beneficiados? Porque não temos políticas públicas adequadas às necessidades e peculiaridades brasileiras? Vale dizer, que as lideranças do setor estão completamente descrentes. Colaboram para não dizer que não participam, mas os formuladores de políticas públicas testam suas teses na vida real, com reflexos altamente nocivos ao desenvolvimento do País e à vida de milhares de pessoas, as afastaram completamente das decisões. Veja o caso do SOFTEX: o Governo, pela primeira vez na história, se apoderou da entidade, eliminando na prática o saudável fórum de discussão representado pelo Conselho de Administração, onde conviviam em debate democrático, governo, academia e indústria. Veja também o CATI, fórum agora totalmente inócuo, onde também a indústria praticamente não tem mais voz! O próprio CATI parece estar totalmente esvaziado!
Nas páginas seguintes, trago minha visão sobre o que aconteceu e vem acontecendo à Industria de Tecnologia da Informação do Brasil, em que as políticas públicas têm grande responsabilidade. Peço que releve meu tom apaixonado. Como lhe disse, sou um escovador de bits, e não um redator qualificado.
Porém, tenho convicção de que procede a reinvindicação feita mais adiante neste documento, uma vez que não é aceitável (não pode jamais ser aceitável!) que:
- As Universidades Públicas, incluindo seus Institutos e Fundações, não usem tecnologia de software nacional.
- Os três poderes do estado brasileiro, Executivo, Legislativo e Judiciário, não usem tecnologia de software nacional.
- O três níveis do Executivo, federal, estadual e municipal, não usem tecnologia de software nacional.
- Os ministérios e órgãos que defendem e fomentam tecnologia, MCTI, MDIC, FINEP, CNPq não usem tecnologia de software nacional.
- Todo Sistema “S”, SEBRAE, CNC, CNI, SENAI, SESI, SENAC, SESC e demais organizações, não usem tecnologia de software nacional.
Desta forma para que fomentar se ninguém usa, observe que já foram gastos mais de 15 bilhões de Reais, com resultados pífios (sim, ocorrem exceções; mas que não chegam a 1% do PIB nacional de TI, estão mais perto do ZERO mesmo, infelizmente).
Pelo o exposto solicitamos Uso do Poder de Compra do Estado como principal Fomento Tecnológico:
- Determinar que 10% do uso de poder de compra do estado nas três esferas públicas seja utilizado para adquirir licenciamento de tecnologia nacional na forma de softwares registrados no INPI por empresas de capital brasileiro residentes no país, a fim de se atingir a desejada soberania tecnológica nacional, exigindo propriedade intelectual brasileira.
- Determinar adicionalmente que mais 10% do uso de poder de compra do estado nas três esferas públicas sejam utilizados para serviços relacionados a Software Público, depositados no Portal de Software Público Brasileiro do Ministério do Planejamento, de formas a distribuir conhecimento de licença grátis a rede pública de saúde, segurança e educação e toda nação brasileira.
Se as observações que faço no Anexo, a seguir, servirem para contribuir para o debate sobre o que temos que fazer para recuperar (sim, eu disse recuperar) o setor de TI nacional, já me darei por contente.
Renovo votos de estima e consideração,
Jairo Fonseca
Empresário
Anexo integral, só leia caso realmente tenha interesse no tema, pois é longa e emocional:
CONSIDERAÇÕES SOBRE TECNOLOGIA DE SOFTWARE, O DESENVOLVIMENTO DO SETOR E O MERCADO DE TECNOLOGIA DA INFOMAÇÃO NO BRASIL E DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE FOMENTO E APOIO.
- BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
O Brasil possuía uma indústria de software vibrante e crescente na década em 1996, vinte anos atrás, sendo então a segunda maior do mundo. Nenhum país, fora os Estados Unidos, possuía tantas empresas de base tecnológica e tanta tecnologia de software quanto o Brasil. Empresas brasileiras haviam desenvolvido sistemas operacionais, banco de dados, processadores de texto, gerência de redes, planilhas, geradores de aplicação, linguagens, compiladores, etc. Ou seja: desenvolviam tecnologia, e não somente aplicações. O Governo e os demais setores econômicos, em seus processos de informatização iniciais, usavam softwares brasileiros. Nossa indústria de TI era forte, se comparada a outras no mundo e prometia exportação em grande escala.
O pico do desenvolvimento tecnológico em software aconteceu em meados da década de 90, com crescimento constante. Como exemplo, vale recordar a feira FENASOFT, em sua edição de 1996, a maior feira de software do mundo, onde eram apresentados centenas de produtos e empresas de base tecnológica brasileiras
Atualmente, constatamos que esta indústria foi destruída ao longo dos anos, por políticas públicas equivocadas e antagônicas à tecnologia brasileira de software. Consequentemente, a FENASOFT também desapareceu, uma vez que não existem mais empresas de base tecnológica em software no Brasil que justifique a existência de tal feira ou nenhuma outra de mesmo porte e finalidade.
Hoje o Brasil não possui nenhuma feira de software significativa.
Sempre teremos ilhas de excelência, as exceções. Mas que seriam melhor caracterizadas por ‘pontos fora da curva’, frutos de esforço descomunal que algumas pessoas fazem para criar tecnologia num ambiente estéril como o brasileiro. Se somarmos todas estas exceções não alcançaremos na geração de riquezas sequer 1% do PIB nacional de TI, demonstrando que o Brasil possui zero virgula alguma coisa deste mercado, em suma, ZERO mesmo.
- O PROGRAMA TI MAIOR
O programa TI Maior, elaborado pelo Governo, é o mais recente engodo oferecido ao setor. Elaborado sem a participação dos interessados, isto é, as empresas que produzem tecnologia de software (não falamos das empresas que usam tecnologia, por exemplo desenvolvimento de aplicativos, governança, suporte ou consultoria, mas sim, daquelas que criam tecnologia), Este Programa é um verdadeiro castelo de cartas, uma peça de publicidade, sem ações consistentes de alavancagem do setor (e ainda destruiu o que se tinha). Procura replicar o que foi sucesso em outros países, sem se atentar para as fortalezas e fraquezas de nossa indústria.
O quadro abaixo, retirado do documento do Programa TI MAIOR disponibilizado pelo MCTI, sumariza os investimentos, no ítem “Onde Investimos”:
| Gestores ou Origem dos Recursos | Reais por Ano |
| PROSOFT do BNDES | 500 milhões |
| Subvenção Econômica da FINEP | 250 milhões |
| Lei de Informática do MCTI | 1 bilhão |
| Lei do Bem do MCTI | 1,6 bilhões |
| Renuncia Fiscal MCTI | 5 bilhões |
| Programas de Exportação do MDIC/APEX | 25 milhões |
| Bolsas e Formação de Alto Nível da CAPES/ CNPq | 200 milhões |
| Qualificação Profissional | 120 milhões |
Resumo: mais de 8 bilhões de Reais foram empregados no fomento em software até 2011, com resultado ZERO em Tecnologia de Software!!
Solicitamos especial atenção para o volume de recursos, não estamos falando de milhões e sim de BILHÕES de Reais, que pertencem ao povo brasileiro e que infelizmente, são mal usados.
Alguma coisa deve estar profundamente errada, equivocada.
- PODER DE COMPRA DO ESTADO
Não estão contabilizados no quadro anterior, os gastos do natural poder de compra do Estado Brasileiro, que possui o 7o. Mercado mundial, avaliado em algumas dúzias de bilhões de reais por ano, onde se destacam: Banco do Brasil, CEF, ECT, diversos Ministérios (Saúde, Fazenda, Trabalho, Agricultura), Tribunais Superiores (TCU, TSE), órgãos de TI do próprio governo: SERPRO, DATAPREV, COBRA, e as companhias estaduais de TI, etc.
O SERPRO e a COBRA que eram fontes de criação tecnológicas foram transformados em distribuidores de tecnologia estrangeira que são fornecidos aos órgãos governamentais sem licitação, pois como veremos mais adiante, tecnologia normalmente é escolhida por critérios espúrios, raramente por licitação. Nas licitações as Tecnologias já estão definidas, sempre estrangeiras.
Sem contar ainda com o fomento e poder de compra do MCTIC, FINEP, CNPq sistema “S”, notadamente SEBRAE, SESC, SENAC, SESI, SENAI, que infelizmente, também renegam a tecnologia nacional de software.
Portanto gastamos muitas vezes mais do que os 8 Bilhões de Reais por ano em tecnologia de software, infelizmente ZERO vai para tecnologias brasileiras.
Enviamos esta carta com o objetivo principal de expor que o Brasil produz 0% (zero por cento) de Tecnologia de Software, e quais os motivos que nos levaram a este ponto.
Temos conhecimento de exceções porém, como já dito, se somarmos todas estas exceções não chegamos a 1% do PIB da Tecnologia de Informação utilizada no Brasil, portanto o resultado é zero vírgula alguma coisa, em números redondos Zero mesmo!
O estado brasileiro necessita urgentemente perceber que tecnologia significa software básico: Sistemas Operacionais, Bancos de Dados, Geradores de Aplicação, Formulários e Relatórios, Linguagens, Compiladores, Frameworks e Ambientes de Desenvolvimento, Servidores Web, Processadores de Texto e Planilhas Eletrônicas, Sistemas de Arquivos, Protocolos de Comunicação, Emuladores, Gerência de Rede, Firewalls e Segurança, Linguagens, Virtualização, Ambiente de Nuvem.
O arcabouço legal brasileiro não distingue a preciosidade de uma empresa de base tecnológica, isto é, que cria e desenvolve tecnologia, das empresas normais de TI que apenas usam tecnologia para desenvolvimento de aplicativos, suporte, consultoria, treinamento, capacitação, governança, além de outras atividades relacionadas a TI.
Desta forma não conseguimos medir, gerenciar, acompanhar ou sequer fomentar, pois se o fazemos de olhos fechados poderemos estar fomentando inovação, capacitação, qualidade, estruturação, certificação, aplicativos, informação, treinamento, suporte, consultoria, etc … mas não tecnologia! Este é o quadro do fomento tecnológico em software que tem perdurado há 20 anos!!
Perseguição às Patentes Brasileiras:
A patente, a propriedade Intelectual, e o bloqueio de compra da Tecnologia Nacional
A situação seria muito ruim até aqui, mas com indignação informo que é pior, solicito a atenção para um fato que ocorre regularmente no uso do poder de compra do governo, pois apesar de não estar relacionado a nada do que foi declarado até agora, também de forma implacável destrói qualquer iniciativa de libertação tecnológica.
Toda instituição pública que usa e pretende expandir o uso de produtos tecnológicos brasileiros, seja através de compra direta, carta de exclusividade, ou mesmo padronizando tecnologia brasileira em editais, rapidamente recebe uma visita de algum fiscal de órgão de controle perguntando qual o interesse em enriquecer as empresas brasileiras, orientando fazer uma concorrência sem especificar o produto nacional!
A perseguição implacável à Carta de Exclusividade faz com que nenhuma empresa de tecnologia nacional que tenha vencido todos os obstáculos, concorrentes monstruosos, a absurda burocracia, a carga tributária exorbitante, fique praticamente impedida de vender para o governo, pois têm origem única. Ou seja, ao ter uma patente ou registro de software, a empresa brasileira fica impedida de vender para o governo. Mesmo não possuindo concorrentes nacionais.
Postura essa, muito diferente de países que hoje são players no mercado mundial, que estimulam o uso do poder de compra para fortalecer a indústria e tecnologia nacional.
Em nossa opinião, a Carta de Exclusividade baseado no Registro de Propriedade Intelectual emitido pelo INPI que é o órgão oficial para registro de marcas, produtos e tecnologias deveria ser a melhor forma de fomentar gerenciar desenvolvimento tecnológico nacional.
O governo deveria estimular as compras pela Carta de Exclusividade para softwares básicos nacionais:
- É um dispositivo legal (art 25 da lei 8.666), não precisa de complemento ou instrução normativa, nem nenhuma outra regulamentação adicional;
- Faz com que as empresas de base tecnológicas se destaquem das empresas genéricas de tecnologia da informação (TI) que produzem tudo, menos tecnologia,
- Fácil de monitorar e evitar os desvios de uso da Carta de Exclusividade, pois a origem única facilita comparação de preços e condições praticadas nos diversos órgãos públicos;
- É o melhor e mais sadio fomento à tecnologia brasileira!
Porem, a realidade é outra, revelando a “Esquizofrenia do Fomento a Inovação Tecnológica de Software” de todo estado brasileiro. Enquanto parte do governo gasta bilhões de Reais anualmente através de instituições do porte do MCTI, FINEP, CNPq, BNDES, APEX, SOFTEX, SEBRAE e todo Sistema “S” fomentando a Inovação Tecnológica, registro de patentes e propriedade intelectual, os Órgãos de Controle desestimulam e proíbem o uso de Carta de Exclusividade, a patente, a origem única! Curiosamente esta limitação acontece apenas para produtos brasileiros.
No Brasil, quem inova tecnologicamente é chamado de empresário maldoso que quer criar dependência das instituições públicas para com seu produto!
Ora, Inovação Tecnológica é exatamente isto, origem única e a consequente Carta de Exclusividade, a dependência de todos que usam tal produto.
Os órgãos de controle não percebem que ao evitar que uma instituição pública fique dependente de um software brasileiro, fará com que esta instituição fique necessariamente dependente de alguma empresa ou produto estrangeiro!!
Nestas circunstâncias a Síndrome de Macunaíma se revela: a castração da criatividade, da inovação, da geração de riquezas.
O Brasil ignora o espírito das Leis em favor da indústria nacional, ignora também Instruções Normativas que a estimulam o uso de Softwares Públicos como forma de sedimentar e distribuir conhecimento, o bom senso de preservar e fomentar tecnologias de software nacional, para entregar todo mercado público a tecnologias estrangeiras, pagamos caro, uma fortuna do tamanho do 7o. PIB mundial em TI para continuar a sermos escravos, o já famoso complexo de inferioridade ou de “vira-lata”.
Indagamos enfim, porque empresas iriam investir em tecnologia própria se será perseguida exatamente por ter patente, e o estado recusará seus produtos por terem origem única, o registro no INPI ? O resultado não poderia ser outro que ZERO!!
Porem infelizmente quando um empresário brasileiro registra um software e tenta vender ao Estado logo é taxado de mal intencionado por tentar criar uma dependência do estado para com sua patente ou marca.
Ora, pelo que é facilmente observado, os países de primeiro mundo enriqueceram suas indústrias exatamente por fortalecer a Propriedade Intelectual, os órgãos governamentais brasileiros estimulam o registro de marcas e patentes.
Portanto, não deveríamos nos admirar quando percebemos que as empresas brasileiras não mais investem em inovação tecnológica.
- A Falta de Representatividade do Setor de TI
Chegamos a uma situação onde até as instituições empresariais (Associações e Sindicatos) que deveriam representar a indústria tecnológica nacional estão praticamente impedidas de atuar, uma vez que atualmente existem apenas empresas de TI que usam tecnologia e não criam tecnologia.
Como nos foi explicado por um grande líder do setor há alguns anos atrás:
“Concordamos e compreendemos seus questionamentos e argumentos, porém, as associações e sindicatos são casas democráticas, e, infelizmente, você esta falando sozinho!”
Esta falta de representatividade nas Associações e Sindicatos acontece porque praticamente não existem mais empresas de base tecnológica, isto é, empresas que desenvolvem tecnologia e não são apenas usuárias de tecnologia.
Porém, fato é que as empresas de base tecnológica não possuem mais sequer representatividade sindical ou associativa, por falta de empresas de base tecnológica.
- O surreal caso SEBRAE Nacional
No sentido de expor mais claramente a perseguição pela qual as empresas de base tecnológicas de software sofrem no Brasil exporemos publicamente o caso do Banco de Dados Documental LightBase no SEBRAE Nacional.
Primeiro um pouco da história, na década de 1990 o SEBRAE Nacional era um dos mais importantes órgãos de fomento à Tecnologia de Software Nacional usando, contratando e estimulando indústria de base tecnológica.
Já em 1991 percebeu a grande inovação tecnológica do Banco de Dados LightBase e iniciou diversos programas de uso da ferramenta, naquela época o SEBRAE Nacional reconhecia inovações tecnológicas nacionais, vários produtos de software brasileiro eram utilizados e comprados com frequência, estimulando a indústria da melhor forma possível, que é o Uso do Poder de Compra como fomento natural.
Pois bem, entre várias aplicações uma se destacava por ser usado por todos os setores e coordenações, o Protocolo e Tramitação de Documentos e Processos do SEBRAE Nacional foi implantado em LightBase em 1992.
O SEBRAE Nacional manteve contrato de suporte e evolução deste sistema ate final da década de 1990, porem quando a direção da instituição mudou no início da década de 2000, tudo mudou.
O inferno instalou-se na terra!
O SEBRAE Nacional simplesmente abandonou toda tecnologia nacional e passou a comprar apenas tecnologias estrangeiras, trocou (ou tentou trocar) o LightBase por produtos Microsoft, um ato injustificado pelo seu próprio estatuto e razão de ser … passou a defender a Microsoft contra uma pequena empresa de base tecnológica nacional, não existe absurdo maior que este !!
Pois usa o dinheiro dos empresários brasileiros, já que o SEBRAE é sustentado pelos empresários brasileiros para defender a indústria nacional, porém fez o contrário, passou a defender a Microsoft contra uma pequena empresa de base tecnológica brasileira. Em outras palavras: persegue a tecnologia nacional em favor de gigantes monopolistas estrangeiros!
Tentaram trocar o sistema em LightBase por produtos Microsoft, o esforço era tremendo, pois aquilo que o LightBase faz naturalmente seria necessário muita programação para fazer o mesmo com tecnologia Microsoft.
Usaram a aplicação em LightBase por mais 10 anos, sem nenhum contrato de suporte, manutenção ou evolução, porem mantinham o contrato com a Microsoft, enquanto o LightBase era rejeitado, banido, perseguido de todas formas.
Em 2010, após 20 anos de uso “finalmente” o SEBRAE Nacional estava livre do LightBase, mudaram a aplicação para tecnologia estrangeira.
Como a tecnologia nacional pode florescer num ambiente deste, onde até as instituições que são criadas para defender a indústria nacional se juntam a grandes monopólios estrangeiros contra as pequenas empresas de base tecnológica nacionais?
Nestes dias de guinadas da Sociedade Brasileira – O Genocídio Tecnológico
Casos como este que aconteceu no SEBRAE Nacional não são a exceção, infelizmente são a regra disseminada por todos os órgãos das esferas governamentais, o uso de poder de compra de todo estado brasileiro é utilizado contra a indústria nacional.
O que aconteceu foi um genocídio tecnológico que deve ser denunciado, estudado, percebido, consertado, de forma que isto jamais possa acontecer novamente, toda uma indústria ou maior parte dela, foi destruída pelo mau uso do poder de compra.
Repetimos, a indústria nacional de software era forte na década de 1990, diversificada com grande qualidade de inovação e tecnologia.
- Proposta de Fomento a Tecnologia Nacional de Software
Seria injusto denunciarmos tudo que incluímos nesta carta sem apresentar formas que achamos corretas para “reimplantar” uma indústria de Software Básico no Brasil, uma vez que uma indústria existia e foi destruída por politicas públicas danosas ao patrimônio tecnológico brasileiro.
O mais importante neste ponto é definir o que é tecnologia de software em contrapartida a desenvolvimento de aplicativos que são uso de tecnologia, mas não tecnologia em si, nem serviços correlatos de TI como suporte, governança, documentação, certificações, etc. Não conseguiremos fomentar o que não conhecemos e definirmos.
Tecnologia de Software significa Software Básico: Sistemas Operacionais, Bancos de Dados, Geradores de Aplicação, Formulários e Relatórios, Linguagens, Compiladores, Frameworks e Ambientes de Desenvolvimento, Servidores Web, Processadores de Texto e Planilhas Eletrônicas, Sistemas de Arquivos, Protocolos de Comunicação, Emuladores, Gerência de Rede, Firewalls e Segurança, Linguagens, Virtualização, Ambiente de Nuvem.
Destacar as empresas que criam tecnologia das que usam tecnologia. Infelizmente o arcabouço legal brasileiro não distingue as empresas que geram tecnologia das que apenas usam tecnologia.
Esta definição deve ser baseada na propriedade intelectual e não apenas na produção e desenvolvimento de aplicativos no Brasil, o que demonstra de forma inequívoca o registro de software, patentes e marcas.
Exigir que os órgãos públicos nas três esferas (federal, estadual e municipal) especialmente os órgãos de fomento MCTI, MDIC, FINEP, CNPq, BNDES, SEBRAE e Sistema “S” em geral, além das integradoras públicas de TI, a saber, SERPRO, COBRA e DATAPREV, e principalmente as Universidades Públicas junto com as centenas (muito provavelmente milhares) de Institutos e Fundações ligados a estas universidades, usem tecnologia nacional de software.
Acabar com a reserva de mercado dos ICTs (Institutos de Ciência e Tecnologia), pois já demonstraram serem completa e absolutamente ineficientes quanto à criação tecnologia e publicação cientifica, de forma geral não geram nem Ciência nem Tecnologia. Basta fazer uma pergunta básica aos ICTs: quais Tecnologias e as Ciências em software foram geradas? Mais uma vez: há exceções. Mas não passam disso, isoladas exceções.
Exigir que a renúncia fiscal da lei de informática seja direcionada para empresas brasileiras de base tecnológica VERDADEIRA, devemos tomar o cuidado de especificar que “base tecnológica” significa as empresas que geram tecnologias e não apenas aquelas que usam tecnologia. Desta forma sedimentar a verdade que uso de tecnologia não pode ser considerado tecnologia, muito menos inovação tecnológica.
Uso do Poder de Compra
- Determinar que 10% do uso de poder de compra do estado nas três esferas públicas sejam utilizados para licenças de tecnologia nacional de softwares registrados no INPI por empresas de capital brasileiro residentes no pais, como forma de soberania tecnológica nacional ao exigir propriedade intelectual brasileira.
- Determinar adicionalmente que mais 10% do uso de poder de compra do estado nas três esferas públicas sejam utilizados para serviços relacionados a Software Público, depositados no Portal de Software Público Brasileiro do Ministério do Planejamento, de formas a distribuir conhecimento de licença grátis a rede pública de saúde, segurança e educação e toda nação brasileira.
É urgente a necessidade de aprendermos que:
- Capacitação em si não é tecnologia: estamos há muitos anos capacitando pessoal em tecnologias estrangeiras, por exemplo.
- Certificações em si não são tecnologia: estamos ha muitos anos estimulando certificações em todo tipo de padrões, nacionais e estrangeiros e nenhuma tecnologia foi gerada.
- Estudos, projetos, consultoria, palestras, participação em feiras, planos de negócios e marketing, infraestrutura, parques tecnológicas, engenharia de software, pontos de função, não são tecnologia de software, muito menos inovação.
Tecnologia de software EXIGE Código Fonte, podemos ter certeza que sem código fonte não existe tecnologia de software.
Repetindo: Quando o assunto é Tecnologia de Software, deveremos sempre parafrasear Shakespeare, exigir categoricamente: Show me the Code!!
Se não existir um software básico com código fonte, não é tecnologia, pode ser tudo, menos tecnologia, simples assim.